"Quando me chamou, eu vim
Quando dei por mim, tava aqui
Quando lhe achei, me perdi
Quando vi você, me apaixonei..."passei semanas cantarolando essa música após o seu nascimento, há três anos atrás. sua chegada foi um chamado, que sei lá de onde veio, mas não existia possibilidade de dizer que não. antes dele passei anos refletindo a possibilidade da maternidade - as vezes tendo certeza de que queria ser mãe, outras certa de que não. e aí que num susto - ao menos no plano material -, descobri você aqui dentro.
é meio querer explicar o inexplicável, mas a sensação é essa mesmo: de que quando me dei conta você já estava sendo gerada aqui dentro. e enquanto tentava entender a gestação... aproveitá-la... pesquisar sobre tudo... mudar de casa... arrumar seu quarto... montar enxoval... seguir conselhos... dormir... pisquei e... quando me dei conta você já estava aqui. e eu já não era mais eu. e logo que você nasceu eu também ainda não era a sua mãe. quem eu era? sem que eu pudesse me dar conta do quão rápido o tempo passava, eu nascia mãe e você foi brotando esse pézinho de sorrisos e vontades. bebê que acordava sorridente, que nunca quis dormir, que 'falava' o tempo todo, não parava por nenhum momento.
lembro-me de forçar minha imaginação tentando prever como seriam tuas feições quando você se tornasse uma menina e perdesse os traços de bebê. esforço sem sucesso. desistia e voltava a babar meu bebê. e me apaixonava e reapaixonava a cada uma dessas viagens no tempo.
dessas viagens, começo a fazê-las mais para o passado do que pro futuro. apesar da ansiedade em te ver crescendo, acho que já aprendi que não vale o esforço de tentar adivinhar, a realidade será sempre muito mais fascinante. hoje vejo na menina que acordou ao meu lado aquele bebê que ontem mesmo dormiu comigo.
você acorda - na maioria das vezes - já sorrindo, mas, em vez de bater suas perninhas de felicidade como fazia aos 3 meses, agora senta na cama me observando para logo em seguida voltar a deitar aninhada no meu corpo. ficamos ali até que você levanta impaciente anunciando que 'agora vamos lá tomar café'.
você segue sem poder ouvir a frase 'vamos dormir'. geralmente protesta com um 'eu não vou dormir nada!', um 'mas não quero dormir hoje!' ou argumenta que 'ainda vamos...' e inventa uma série de atividades inadiáveis para prolongar o antes-de-dormir. apesar de não ser meu momento preferido contigo, ainda prefiro essa hora de dormir com a menina-argumentadora do que com o bebê-choroso.
aliás, quanta argumentação pode caber numa menininha que beira os 3 anos? o bebê-falante virou uma menina-mais-falante-ainda. 'vou pisar na poça, pois estou de galochas'. 'não preciso de ficar na sombra puquê já passei filtro e estou de chapéu'. 'vou de vestido e short pra pracinha para não machucar meu bumbum'. 'meus pés estão cansados, quero colo'. 'me empresta seu celular? eu te empresto um brinquedo'. 'quando eu crescer vou poder sair sozinha'. é o preço que pago por criar filha pra ser questionadora. preço que pago feliz.
e não, você ainda não para por um segundo. mesmo quando está cansada, com sono, está a mil. correndo. pulando. cantando. brincando. falando pelos cotovelos. e isso é exaustivo - pra mim, claro, pra você não parece fazer diferença. eu rio sozinha quando alguém comenta 'ela não para, né?'. não, não para. mas você é assim. você sempre foi assim. teu tempo parece correr mais rápido do que o do resto do mundo.
dia desses você admitiu pra mim: 'mamãe, eu gosto de fazer as pessoas rir, pra elas ficarem felizes'. sorri pra você e transbordei de orgulho dessa menininha-bacana - como você gosta de dizer que é - que está crescendo junto comigo.
que sorte a minha que você veio.
que sorte a minha que estamos aqui juntas.
feliz aniversário, Dora.